(Alessandro)
A clínica estava silenciosa e o corredor cheirava a desinfetante e tranquilidade forçada. Mas nada ali me acalmava.
Meus passos eram firmes, mesmo com a dor leve pulsando onde antes havia um órgão a menos. Mas era engraçado... depois de tudo que vivi nos últimos dias, aquela dor física era a menor das minhas preocupações.
Abri a porta do quarto devagar.
Cauã estava lá, sentado em frente à TV, os olhos pregados na tela como se aquilo distraísse sua mente por um segundo sequer. Quando me viu, um sorriso leve surgiu nos lábios dele.
— Oi. — disse baixo, meio arrastado.
— E aí, cara — tentei sorrir também, me aproximando. — Como você tá?
— Bem. — respondeu, e apesar da voz ainda lenta, já dava pra ver que a fisioterapia estava funcionando. Os movimentos estavam mais firmes, mais controlados.
Me sentei ao lado da cama dele, suspirando.
— Preciso te contar uma coisa. — falei, sério.
Ele me olhou, atento.
— A Larissa foi sequestrada.
O sorriso dele morreu na hora e os olhos arregalaram.
— O... o quê?
— Foi o Enzo. Ele se aproximou dela sem eu saber. Ela foi atrás dele por conta própria, achando que estava fazendo a coisa certa... aconteceu um massacre em uma clínica clandestina ontem a noite e ela desapareceu. — respirei fundo. — Eu não sei se é só o Enzo por trás disso... ou se o Matheus também tá envolvido.
Cauã desviou os olhos para a parede em silêncio.
— Você sabe se foi o Enzo mesmo quem matou o velho?
Ele fechou os olhos por um instante e quando abriu, murmurou…
— Não foi o Enzo.
Meus músculos travaram.
— Foi o Matheus?
Ele assentiu devagar, com os olhos pesados de tristeza.
— Foi por causa da Chiara. — disse, quase num sussurro.
Um arrepio me percorreu inteiro e meu estômago virou. — Como assim... por causa da Chiara? Que porra é essa, Cauã?
— Alessandro... — ele tossiu baixo, e eu já peguei o copo com água pra ele — ...Chiara não é quem você acha que ela é. Aquela Chiara inocente, doce, que você amou... ela não existe mais. Ou talvez... nunca tenha existido.
Fiquei olhando pra ele, em choque, tentando entender o que ele estava dizendo.
— A Chiara traía o ex-marido. — ele continuou, a voz falha. — Desde o começo do casamento... com o Enzo. Depois... ela começou a se encontrar com o Matheus às escondidas.
— Peraí... — levantei a mão, tentando parar aquela avalanche — você tá me dizendo que ela estava ficando com os dois irmãos? Filhos do marido dela?
— É. — ele assentiu, triste. — O velho descobriu. Foi logo depois de assinar aquele acordo bilionário. O Enzo sempre foi ganancioso, mas ele não matou o pai, ele tinha armado um plano com a Chiara pra pegar toda a grana, dar um golpe. E conseguiram. Mas ela... ela traiu ele também e sumiu com o dinheiro. Quando o Enzo descobriu que ela tava com Matheus... ficou fora de si.
Meu coração batia tão alto que parecia ensurdecedor.
— Eles tentaram encobrir tudo. O Matheus foi esperto, limpou tudo, mas eu encontrei vestígios... havia sinais de que alguém empurrou o velho da escada. E quem encobriu foi Matheus.
— E... e você acha que... — minha voz falhou — ...quem empurrou foi a Chiara?
Ele me olhou, com pesar e balançou a cabeça positivamente.
— Provavelmente. — disse. — Eu tinha provas. Tava tudo registrado, conversas, fotos... mas foi tudo no carro e pegou fogo no acidente.
A cadeira onde estava parecia ter virado uma armadilha. Me levantei de repente, cambaleando um pouco.
— Não... não pode ser. — sussurrei, o coração martelando no peito. — A Chiara nunca faria isso.
— Eu sei que é difícil acreditar. — ele murmurou, com a voz fraca.
— Não... não, caralho! — bati com a mão na parede, tentando conter as lágrimas. — Eu vivi com ela, a amei. Porra, Cauã, eu quase casei com ela!
— Aquele homem... o velho Rossi... — continuou ele, a voz mais baixa ainda — ele deixou relatos escritos e conversas. Disse que ela era uma noiva terrível. Que enganava ele, esbanjava o dinheiro, o traía com vários. Disse que ela nunca cumpria com os “deveres de esposa”... que usava o casamento como fachada.
Senti como se minha cabeça fosse explodir. Tudo girava. As lembranças, os beijos, os sorrisos... tudo distorcido agora. Como se eu tivesse vivido uma ilusão.
Essa Chiara... essa mulher maquiavélica, interesseira, manipuladora... não era a garota que me roubava beijos atrás da escola, não era a mulher que dormia abraçada comigo dizendo que nunca me deixaria.
Droga.
Droga.
Como eu pude ser tão cego?
Eu me lembrava da forma como tratei a Larissa. Como a expulsei de casa. Como destruí o que ela mais amava: o legado do pai.
Tudo por causa da Chiara.
A Chiara que eu coloquei na cama que era minha e da Larissa.
Meus olhos arderam. Apertei o volante com força. O peito contraía com um gosto amargo na garganta.
Eu não merecia o perdão da Larissa. Não depois de tudo.
Pisei fundo no acelerador, o carro ganhando velocidade na estrada, a paisagem passando borrada pelas janelas. O vento entrando pela fresta da janela parecia zombar de mim.
“Eu fui um idiota…”
Meu coração estava aos pulos. O retrovisor me mostrava um rosto transtornado. Um homem que já não sabia mais quem era.
A raiva queimava e a culpa me devorava.
“Você colocou tudo a perder, Alessandro.”
A rodovia à frente parecia estreitar. Uma carreta surgiu na pista lenta e eu decidi ultrapassar. O carro rugiu quando mudei de faixa.
Foi aí que eu vi um farol vindo direto na minha direção e não dava tempo.
Joguei o carro pro acostamento com tudo.
— MERDA!
As rodas deslizaram na terra solta e o volante vibrava nas minhas mãos. Senti o carro sair da pista e perder o controle.
E então o impacto. A lateral bateu com força contra uma árvore, um barulho seco, metal se amassando, vidro estourando. Meu corpo foi jogado contra o banco, mas o cinto me segurou.
E tudo escureceu por um momento. Ficou tudo em silêncio, tudo… finalmente… em silêncio.
Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Aliança Provisória - Casei com um Homem apaixonado por Outra
Esse tbm. Será que nunca vou ler grátis...