Acordei com a sensação de que nem tinha dormido. Meu corpo doía, minha cabeça parecia um moinho rodando sem parar, e tudo que eu queria era ficar deitada mais cinco minutinhos. Mas eu tinha que trabalhar.
Fui até o espelho e encarei meu reflexo. As olheiras ainda estavam lá, firmes e fortes. O rosto abatido, os olhos meio sem brilho. Mas o que mais me chamou atenção foi minha expressão... um cansaço que vinha de dentro.
Levei a mão até a barriga e respirei fundo.
— Vamos tentar ter um dia tranquilo hoje, tá? — murmurei, tentando soar mais firme do que realmente estava.
Depois do banho, prendi o cabelo num coque improvisado, vesti uma roupa leve e confortável. Peguei minha bolsa e fui até o carro, torcendo pra mente parar de rodar um pouco. Liguei o rádio, coloquei uma música calma e entrei na estrada.
O dia estava claro, promissor até. Mas minha cabeça… minha cabeça ainda estava na noite passada.
"Será que ele vai mesmo resolver tudo?"
"E se ele me procurar de novo querendo outra chance, o que eu faço?"
"E se for verdade o que ele disse… que ainda sente algo?"
Fechei os olhos por um segundo e suspirei. Não podia me deixar levar. Eu estava grávida, tinha uma vida dentro de mim e uma responsabilidade enorme nas mãos. Precisava ser firme. Por mim e por esse bebê.
Ouvi o som seco de uma freada brusca, seguido de uma batida abafada. Meu corpo inteiro ficou tenso e reduzi a velocidade olhando para o lado.
Um carro preto, com o capô visivelmente amassado, estava parado no acostamento. E ao lado dele, um homem alto, com as mãos na cintura e o olhar impaciente. Franzi o cenho ao reconhecê-lo
Estacionei o carro no acostamento e desci, me aproximando.
— Diogo?
Ele levantou a cabeça ao me ouvir e arregalou os olhos.
— Larissa?
— Está tudo bem?
— Estou sim, foi só um susto. Um motoqueiro cruzou do nada, tentei desviar e acabei batendo na traseira do carro da frente. Já resolvi com o outro motorista, mas meu carro... — ele deu um leve chute no pneu da frente — não vai andar nem dois metros.
Observei o estrago e assenti.
— Parece que não vai mesmo.
Ele pegou o celular do bolso e fez uma ligação rápida.
— Tô chamando meu agente. Ele vai vir resolver isso aqui e mandar rebocar. Mas eu ainda tenho que passar na empresa…
— A empresa do Alessandro?
Ele assentiu.
— É. Tenho uma reunião com o setor de comunicação.
Ponderei por um instante.
— Quer uma carona?
Diogo me olhou surpreso.
— Tem certeza? Eu posso…
— Diogo, só entra no carro. A gente tá indo pro mesmo lugar. — dei um meio sorriso. — E, sinceramente, vai ser até bom conversar com alguém que não envolva drama.
Ele deu uma risada baixa e fomos para o meu carro.
No caminho, o silêncio inicial foi confortável. Eu dirigi devagar, aproveitando a brisa da manhã, e ele ficou olhando pela janela por um tempo, pensativo. Até que quebrou o silêncio.
— E o bebê? Como vocês estão?
Por um segundo, fiquei surpresa. Tinha até esquecido que Diogo sabia. Mas seu tom foi tão genuinamente calmo, que meu corpo relaxou um pouco.
— Estamos bem. Comendo muito, dormindo pouco... mas bem.
Ele sorriu.
— Fico feliz por vocês. Sério.
— Obrigada. — olhei rapidamente pra ele. — Fiquei sabendo que o Alessandro te procurou.
— Ah, sim… mas foi só pra conversar sobre a campanha da empresa. Coisa de trabalho.
Assenti. Eu tinha minhas dúvidas.
— Entendi.
— E você? — ele virou um pouco o rosto pra mim. — Vai mesmo continuar lá?
— Por enquanto, sim. Estou cumprindo o aviso.
Ele ficou em silêncio por um instante e depois sorriu de canto.
— Você é forte, Larissa.
Desviei o olhar pro retrovisor, sentindo um calor estranho no peito.
— A gente aprende a ser, né?
Ele não respondeu, mas percebi o modo como ele me olhava. Como se estivesse enxergando algo além da casca.
O prédio da empresa surgiu à frente, imponente como sempre. Alto, de vidro espelhado, refletindo o céu azul como se estivesse acima dos problemas de todo mundo. Mas o meu coração, ah... ele apertava mais a cada metro que a gente se aproximava.
Estacionei o carro no subsolo e seguimos até a entrada principal. Diogo estava ao meu lado, mexendo no celular. Quando saímos do elevador do estacionamento e cruzamos o saguão, foi como se o tempo desse uma travada.
Lá estava ele.
Alessandro.
De terno escuro, com a gravata levemente solta e as mangas da camisa dobradas. Ele estava saindo da catraca, conversando com alguém da diretoria, mas quando os olhos dele encontraram os meus... o mundo ao redor meio que silenciou.
O rosto dele se fechou na hora. Não com raiva, mas com aquele tipo de tensão que a gente sente na nuca. Como se alguma coisa dentro dele tivesse sido ativada.
Diogo parou ao meu lado e eu senti quando ele ficou mais rígido.
— Merda… — ele murmurou, quase para si mesmo.
Deixei escapar uma risada cansada, balançando a cabeça.
— Quem me dera fosse novela, pelo menos eu tinha direito a um intervalo comercial.
Ela riu junto, mas depois ficou séria de novo.
— E falando sério agora... Se precisar de qualquer coisa, nem pensa duas vezes. Eu tô aqui, tá?
— Obrigada, Cath — murmurei, sentindo o nó na garganta apertar. — Eu vou ficar bem. De verdade.
— Ah… Falei com o Rafa ontem.
Meu coração deu um pulo no peito.
— É? — perguntei, tentando soar natural, mas sei que minha voz saiu meio falhada.
— Sim. Ele já chegou na Alemanha, tá se ajeitando na empresa nova.
Catherine deu um sorriso de canto.
Respirei fundo, sentindo aquele peso familiar apertar no meu peito. A culpa. Sempre ela.
Baixei o olhar para minhas mãos, que brincavam nervosamente com uma caneta.
— Eu ainda não falei com ele — confessei, num sussurro.
Catherine soltou um suspiro e se inclinou, me obrigando a olhar nos olhos dela.
— Larissa, você não precisa se torturar. Mas... também não pode adiar pra sempre.
— Eu sei — murmurei, mordendo o lábio.
Ela apertou minha mão com carinho.
— Só fala com ele quando tiver certeza do que vai dizer. Quando souber que vai contar tudo. — Seus olhos eram firmes, mas gentis. — Não é justo com ele ficar no escuro. Nem com você mesma.
Assenti devagar, sentindo o nó na garganta se formar de novo.
— Eu vou falar, Cath. Juro. Quando eu estiver pronta... quando eu puder olhar pra ele — ou pra tela do celular, né — e contar tudo. Do jeito certo.
Ela sorriu, daquele jeito cúmplice, compreensivo.
— Eu sei que vai. Só... não demora muito, tá? Às vezes a gente perde a chance de consertar as coisas porque fica enrolando demais.
Fechei os olhos por um segundo, absorvendo aquelas palavras.
Ela estava certa. Eu sabia disso.
— Obrigada — falei, meio rouca.
Catherine levantou e pegou o café dela de novo saindo da sala.
Encarei as mãos, perdida nos meus pensamentos quando o celular vibrou em cima da mesa, me arrancando daquele redemoinho mental.
Peguei o aparelho achando que era alguma mensagem do hospital ou do trabalho, mas o número era desconhecido.
Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Aliança Provisória - Casei com um Homem apaixonado por Outra
Esse tbm. Será que nunca vou ler grátis...