Acordei com a luz fraca entrando pelas frestas da cortina. Pisquei devagar, sentindo o peso da noite mal dormida nos meus olhos. Me sentei na cama e respirei fundo, levando a mão até minha barriga ainda discreta.
Sorri de leve, com aquele carinho bobo que só uma mãe consegue ter mesmo sem ver ainda o rostinho do filho.
— Bom dia, meu amor... — murmurei baixinho, quase num sussurro. — Tá com fome, hein?
Me espreguicei devagar e me levantei, indo direto pro banho. A água morna escorria pelas costas e, por alguns minutos, me permiti esquecer o caos. Só eu, meu bebê e o som da água. Vesti um vestido leve, largo, que não apertava a barriga, porque qualquer coisinha já me deixava enjoada.
Desci as escadas devagar e encontrei Margarida com a mesa já posta. Ela era sempre cuidadosa, atenciosa.
— Bom dia, Margarida — falei com um sorriso, me sentando.
— Bom dia, dona Larissa. Dormiu bem?
Assenti com a cabeça, tentando não demonstrar o quanto minha mente estava bagunçada.
Coloquei um pouco de salada de frutas no prato, peguei um pão com ovo e enchi o copo de suco. Só que, no primeiro gole do suco, o enjoo me tomou de jeito. Fechei os olhos e respirei fundo. Droga.
Empurrei o prato de leve e me concentrei só no suco. Talvez mais tarde conseguisse comer alguma coisa.
Meu celular vibrou na mesa e o peguei, vendo uma mensagem de Diogo.
Diogo: “Deu tudo certo. A ficha já foi ajustada. Pode ficar tranquila. Se o Alessandro for atrás, ele não vai descobrir nada sobre a gravidez.”
Soltei um alívio disfarçado e respondi.
Eu: “Obrigada, Diogo. De verdade.”
Mal terminei de escrever, ouvi passos se aproximando. Endureci na cadeira sem precisar olhar.
Ele.
Alessandro entrou e se sentou à mesa. Guardei o celular rápido e me concentrei no copo. Nem o encarei. Só queria sair dali.
Mas claro que ele não ia deixar passar.
— Você não vai comer nada? — perguntou com a voz baixa, mas cortante.
Não respondi. Me levantei, ajeitando o vestido, pronta pra sair dali.
— Larissa — ele disse de novo, segurando meu pulso. Sem força, mas o suficiente pra me parar. — Você não vai comer?
Olhei pra mão dele no meu braço, depois pro rosto dele.
— Eu perdi a fome quando você apareceu.
Vi a expressão dele mudar. Ficou sério, duro.
— Você tá agindo como uma criança. Eu sei que você passou mal no aniversário. E sei que foi por não estar se alimentando direito.
Parei.
Arregalei os olhos e encarei ele.
— Você... você foi atrás da minha ficha?
Ele deu de ombros, como se não fosse nada.
— Fiquei preocupado.
— Preocupado? — ri, debochando. — Se estivesse mesmo preocupado, teria me levado ao hospital. Mas não. Você deixou o seu melhor amigo me levar enquanto cuidava de outra mulher.
Ele se inclinou na cadeira, cruzando os braços.
— Quem começou com tudo isso foi você! Você empurrou a Chiara! — rebateu, a voz subindo um tom.
— Ah, cala a boca, Alessandro! — respondi, mas minha voz saiu calma, seca. O encarei por um segundo e soltei com desprezo: — Tolo.
— Repete isso — ele disse, estreitando os olhos.
Revirei os meus, sem paciência. Me virei pra ir embora.
— Eu não quero brigar — ele murmurou, como se ainda tivesse alguma esperança de diálogo. — O pé da Chiara já tá melhor... só falta você ficar bem também. Se alimentar, se cuidar...
Parei. Me virei de novo, agora mais erguida.
— Eu não preciso da sua preocupação. Diogo cuidou de mim. Cuidou como você nunca cuidou em todos esses anos. — Disse com firmeza, cortando ele como uma faca.
Dei um passo pra sair, mas ouvi ele empurrar a cadeira com força. Ele veio atrás. Antes que eu alcançasse o banheiro, senti meu corpo sair do chão.
— Alessandro! ME SOLTA! — gritei, assustada. — ME SOLTA AGORA!
Mas ele não soltou. Me levou até o sofá e me jogou ali, deitada, ficando por cima. Tentei me soltar, me debati com raiva, mas aí lembrei... meu filho.
Parei. Respirei fundo, o coração ainda acelerado.
Fiquei quieta.
— Você só vai sair daqui depois que comer alguma coisa.
Me virei e vi Alessandro parado ali, do lado de fora, com uma maçã na mão.
Uma maçã? Ele tava brincando comigo?
Arqueei a sobrancelha, sem entender o joguinho dele.
— Que diabos você tem, Alessandro?
Ele só me olhava. O lábio ainda sangrando de leve por causa da mordida. Uma parte de mim sentiu culpa. Uma bem pequena. Mas senti.
Olhei pra maçã de novo. Depois pra ele. Suspirei fundo, com a paciência no fim.
— Tá bom. É isso que você quer? Que eu coma? — arranquei a maçã da mão dele com força, como se fosse um prêmio de consolação. — Pronto.
Dei uma mordida grande, quase como se fosse pra provar algo. Mastiguei encarando ele. Não era por ele. Era pelo meu filho.
— Agora manda abrir essa merda de portão.
O segurança me olhou, hesitante, claramente esperando o sinal dele. Alessandro, com aquela expressão que eu odiava e amava ao mesmo tempo, só fez um aceno com a cabeça. E o portão começou a se abrir.
Sem tirar os olhos dele, dei a segunda mordida na maçã. Depois a terceira.
Arranquei o carro, saindo dali com um aperto no peito e a raiva ainda queimando por dentro. Mas continuei comendo. Mordida por mordida. Cada uma mais cheia de rancor do que a outra.
Ele tinha vencido a pequena batalha... mas só essa.
Joguei o resto do talo da maçã na sacola do lado e respirei fundo. Não era o Alessandro que importava. Era meu filho.
E hoje... hoje eu precisava de alguém que me lembrasse de quem eu sou. De onde eu vim. E que me ajudasse a manter os pés no chão.
Peguei a primeira saída e virei à esquerda. Só conseguia pensar numa coisa:
Vou visitar meu pai.
Talvez ele soubesse me dar um abraço silencioso, daqueles que curam. Talvez ele só dissesse que tudo ia ficar bem... E mesmo que fosse mentira, eu precisava ouvir isso agora.
Estacionei o carro em frente à casa e fiquei ali alguns segundos, só olhando pra fachada simples, o portão entreaberto, o som dos passarinhos no fundo. Um suspiro escapou do meu peito. Um alívio.
Pelo menos aqui... eu podia respirar.
Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Aliança Provisória - Casei com um Homem apaixonado por Outra
Esse tbm. Será que nunca vou ler grátis...