- Feliz em se livrar da gente? – Yuna reclamou.
- Um pouquinho. – Brinquei.
- Achei que você não fosse comprar a casa... – Do-Yoon observou.
- Foi quase um ano para aceitar parcelar. – Yuna riu.
- Esta parte ainda me perturba. Tenho medo de deixar a dívida para minha filha.
- Não exagere. – Yuna subiu a escada estreita, que levava para o segundo andar.
- Eu... Estou pensando em comprar um imóvel para mim também. – Do-Yoon falou baixo.
- Eu... Não sei se o parabenizo ou dou os pêsames. – Fui sincera.
- Por quê?
- Primeiro, porque a dívida será eterna. Segundo, porque Yuna vai matar você.
- Acho que ela vai permitir.
- Permitir?
- Ela é a mais velha. – Ele sorriu de forma tímida.
- Que se foda essa parte da tradição, Do-Yoon. Vocês moram em Noriah Sul. Visitam seu país de origem uma vez no ano.
- Você é muito desbocada.
- E você medroso. E não falo só da compra da casa. Falo de Lianna também.
- Falando nisso... – ele sorriu, fazendo com que eu me abanasse com a própria mão, não só pelo calor, mas também pelo belo homem que ele era – Eu vou assumir um novo cargo na escola.
- Promoção?
- Mais ou menos. Vou ir para a parte de supervisão escolar.
- Do-Yoon, que notícia boa. Você merece, pelo tempo que dedica a esta escola, os alunos, os seus colegas de profissão.
- Eu vou assumir este cargo junto com a professora de Matemática.
- Legal. Melhor seria se fosse com Lianna, não acha?
- Também... Mas a questão é que vai abrir uma vaga para professor de Matemática.
Olhei-o, enrugando a testa:
- Deus, eu gritaria neste momento. Mas não vou criar falsas expectativas, afinal, eu sou Sabrina.
- Acho que a Sabrina azarada ficou lá atrás. Você se ergueu, dona madame. Tem uma casa própria, uma filha linda, um emprego...
- Não posso reclamar da vida... Nem do emprego. Me formei, graças às aulas particulares... E a sua ajuda. E também o emprego noturno. E fora a elaboração de provas para concursos, que também gera uma renda extra.
- Trabalhar na Escola Progresso é um privilégio de poucos. O salário é altíssimo e você não encontrará nada melhor... Ao menos em Noriah Sul.
- Acha que não sei? Exatamente por isso que não quero me empolgar. E, antes de chegar lá, perder o táxi, ou derrubar café na diretora, ou dizer uma bobagem sem intenção... Quem sabe rasgar a calça na bunda ao sentar. – Comecei a rir.
Ele balançou a cabeça e riu:
- Posso indicar seu nome?
- Pode sim.
- A entrevista é amanhã.
- Já? Eu sequer estudei antes.
- Não há prova. É entrevista.
- Por isso mesmo. Eu sou péssima nisso e você sabe muito bem.
- E Do-Yoon e tia Yuna também podem participar das nossas noites?
- Podem... Mas já vou adiantando que nem sempre vou querer dividir você.
As camas haviam sido montadas, mas as roupas seguiam em caixas, pois não demos conta de arrumar tudo e eu ainda tive aulas para dar naquela tarde. Quando olhava para o estado de tudo, imaginava que levaria meses para organizar o nosso espaço.
Separei a roupa e vi o vidro com a “casa” da tartaruga ao lado do travesseiro:
- Medy, você não pode dormir com a tartaruga.
- Por quê?
- Porque é uma tartaruga.
- Por que não posso dormir com ela por ser uma tartaruga?
- Ah, Medy, não sei explicar. Mas não pode.
- Mas tem que haver uma explicação.
- Eu acho que você é superdotada, só pode.
- O que é superdotada?
- Preciso aprofundar meus estudos sobre isso. Mas igual, você não pode dormir com a tartaruga – Falei, enquanto trocava a roupa dela.
- Antes de sairmos, precisamos colocá-la um pouquinho no sol, porque você chega tarde e então não haverá mais sol para ela.
- Ok, vou colocar ela no sol enquanto você escova os dentes. Vou deixar seu chocolate pronto e espero você lá embaixo. Verifica se está tudo na mochila antes de descer.
- Posso não escovar os dentes... Só hoje?
- Não... Deve escovar os dentes, todos os dias.
Desci com a tartaruga e sua casa de vidro. Abri a porta dos fundos e a pus diretamente no sol. Aliás, seria um dia daqueles: no mínimo uns quarenta graus. Estávamos no auge do verão em Noriah Sul.
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