Poucas horas antes do tiroteio, Nicole sentiu as mãos magras que a sacudiram pelos ombros. Ela se mexeu e olhou dentro dos olhos castanhos da mulher pálida com rugas no canto dos olhos. A senhora de meia-idade segurou Nicole pela mão e a ajudou a se levantar.
― Vem, madame! Vamos aproveitar que o Zé saiu.
― Para onde vamos?
Nicole gemeu baixinho e colocou a mão na frente dos olhos para proteger da luz solar quando chegaram a uma porta de madeira com a parte debaixo danificada.
― Nós vamos atravessar aquele matagal. ― Deram alguns passos por uma viela estreita até chegar ao meio do mato. ― Cuidado com os buracos.
― Por que a senhora está me ajudando?
― A mulher que contratou o Zé exigiu que terminasse o serviço hoje.
― O meu esposo vai pagar o resgate!
― Se liga, madame! ― Empurrou alguns galhos finos de uma planta silvestre, esperou que Nicole passasse. ― Contrataram o meu Zé para matar você.
― A senhora sabe quem é a mandante?
Nicole caminhou devagar ao passar por entre duas pedras.
― Não sei, meu filho não contou. ― Pigarreou e tossiu em seguida. ― Eu sei que essa mulher te odeia e pagou caro para tirar você do caminho dela.
Pouco a pouco o tom alaranjado dava lugar ao breu da noite, os mosquitos picavam a pele do rosto e dos braços. Ambas atravessaram uma pequena vala quando ouviram os primeiros estampidos da troca de tiros.
― Se abaixa, madame!
Nicole deitou de lado no chão ao lado da mulher que a abraçava, não compreendeu como uma pessoa tão boa se envolveu no mundo do crime. Ficaram ali enquanto ouviam os barulhos por quase cinco minutos.
― Vem, madame! ― Ajudou a Nicole a se levantar. ― Apressa os passos. Falta pouco para a estrada, dali você pega o seu rumo.
― Eu não sou madame, moro no subúrbio do Rio.
― O Zé falou que você é esposa do bacanaço.
― Eu era! Estamos separados.
― O doutor é chefão na rede de hospitais da família Bittencourt. ― Tencionou o canto da boca.
― Como seu filho sabia disso?
― Não sei! ― Deu mais alguns passos à frente de Nicole.
O som dos carros que passavam na rodovia chamou a atenção de Nicole. Olhou para o lado esquerdo.
― Toma cuidado, garota! Agora segue o seu rumo. ― Apontou para a rodovia. ― Volta para a sua vida e vai lá cuidar do teu filho.
― A senhora vai voltar para o casebre?
― Não! Eu tenho mais dois filhos. Preciso pegar eles e fugir.
― Obrigada! ― Nicole a abraçou. ― Qual é o seu nome?
A mulher se afastou de Nicole e correu para o outro lado da rodovia quando viu a movimentação no meio do mato. Em poucos segundos, ela desapareceu no meio da escuridão da noite.
― Podemos discutir sobre isso depois? ― Os lábios se moveram em uma careta irônica. ― Agora eu só quero um bom banho, comida e cama.
Puxou-a para dentro dos braços e a manteve presa por entre os ombros largos que aqueciam o corpo e o coração.
― Nunca mais faça isso! ― sussurrou a voz barítona. ― Você saiu sem avisar para onde ia e eu quase perdi você. ― Beijou-lhe o topo da cabeça e a segurou próxima ao peitoral.
― A Rosa te contou?
Nicole acenou fracamente para a governanta que os observava de longe e afastou Alexander.
― Falamos sobre isso depois. ― Ajudou a esposa a ficar em pé.
Ela pousou a mão direita nas costas.
― Eu estou fedendo, preciso de um banho urgente!
― Se você quiser, eu te ajudo e depois eu faço uma massagem.
O sorriso de Alexander se abriu em uma curva perfeita.
― Não! Hoje eu só quero dormir, mas eu aceito a massagem.
― Eu só quero dormir agarrado com você ― disse ele sorrindo.
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