Faltam 30 dias para eu ir embora — Sr. Gabriel perdeu o controle romance Capítulo 224

— Se controla, tá me ouvindo? Para de implicar com a minha amiga, ou eu juro que você vai se ver comigo. — Letícia ameaçou, dedo em riste.

Eduardo sequer piscou. A ameaça, para ele, não significava absolutamente nada. Seguiu com aquela postura arrogante, como se ela nem estivesse ali.

A atitude dele só deixou Letícia ainda mais irritada. Mas, ao mesmo tempo, sabia que com o irmão era inútil tentar ganhar no grito.

Discutir? Nunca conseguia vencer.

Bater? Uma palmada dele já seria suficiente para deixá-la no chão, incapaz até de levantar-se.

Se fosse qualquer outra pessoa fazendo mal à Bia, Letícia já teria partido pra cima. Mas o problema era o Eduardo. Desde criança, ele sempre esteve por cima dela, literal e figurativamente.

De raiva passou para impotência. Depois, para frustração... E terminou suspirando, com a amarga sensação de que não conseguia proteger a própria amiga.

“Que tipo de amiga eu sou, afinal?” pensou, arrasada.

Tentando uma abordagem mais suave, mudou o tom:

— Ela já sofreu demais, sabia? Custa ter um pouco de compaixão? Para de descontar em uma garota inocente e vulnerável. Você nem imagina o quanto a Bia passou. De verdade, Eduardo... Custa ter um pingo de humanidade aí dentro?

Entrou então no modo dramático total, ativando o talento nato para dramatização.

Começou a despejar tudo o que sabia sobre a história da Beatriz. E ainda acrescentou umas tintas extras de tragédia, para ver se amolecia o coração do irmão.

— Ela é órfã, sabia? Cresceu num orfanato onde era ignorada, excluída, até bullying sofria. Vivia com fome, magrinha, doente... Teve vezes que quase morreu de desnutrição! Depois, foi estudar — tudo com o próprio esforço, catando latinha e papelão pra vender e conseguir comer uma vez por dia. E como se não bastasse, se casou com o Gabriel e foi viver um inferno. Xingamentos, agressões, hematomas por todo lado. Fraturas eram comuns. Até hoje ela tem marcas pelo corpo. E você ainda vem brincar com ela?

Letícia já estava com a voz embargada. Respirou fundo, fungou discretamente e completou, num tom suplicante:

— Por isso, irmão, eu te imploro. Deixa ela em paz. A Bia já passou por mais coisa do que qualquer pessoa aguentaria. Entrou na Aurora e mal começou a trabalhar, já foi alvo de fofoca, denúncia falsa, boato pra tudo que é lado. Todo mundo se acha no direito de pisar nela, e ela nem se defende! Ontem à noite fui lá, me impus, falei quem eu era, e só assim consegui dar um pouco de proteção pra ela.

Terminando o discurso emocionado, ela olhou para o irmão no sofá, que... Continuava comendo. O rosto sem reação, expressão neutra, como se estivesse vendo a previsão do tempo.

— Se não acredita em mim, vai perguntar lá na Aurora. Juro por tudo que é mais sagrado! Se eu estiver mentindo, que um raio caia na minha cabeça agora mesmo!

Ela achava que o silêncio dele era ceticismo, que ele não estava levando a sério.

Mas Eduardo... Simplesmente não respondeu. Levou o garfo à boca, pegou um pedaço de costela e pensou:

— Não tá tão boa quanto a da Beatriz.

Mas... Depois pensou melhor.

“Bom, isso foi há mais de vinte anos... E se naquela época o lugar não tivesse estrutura?

E se o diretor fosse negligente? Tivesse favoritos?

E o bullying?

Isso sim parecia mais do que real. Afinal, por que outra razão uma garota tão nova precisaria catar garrafa e papelão no meio da rua pra conseguir comer durante os anos escolares? O governo até ajudava, mas nem sempre chegava a quem precisava.”

Pela primeira vez em muito tempo, Eduardo sentiu uma pontada de culpa.

Algo nele vacilou.

Começou a xingar a si mesmo, em silêncio:

— Você foi longe demais, idiota. Tá achando que tá sendo espirituoso, mas tá fazendo o mesmo que aqueles canalhas que maltrataram ela no passado. No fundo, você foi igualzinho.